quinta-feira, 25 de março de 2010

O Primeiro e o Último



Banana.
O meu primeiro beijo teve sabor a banana. Pelo menos é o que me lembro de comentar com os meus colegas de escola a caminho da cantina.
Ao contrário do que seria literariamente agradável, o momento do beijo não teve nada de romântico ou de poético. Naquele dia , em vez de ir jogar à bola, decidi entrar num jogo de beijinhos que algumas meninas e meninos da minha idade jogavam num recreio escondido da minha escola. O jogo era simples: havia oito pares de objectos iguais (duas pedras, dois pauzinhos, dois berlindes...) Cada um de nós escolhia um desses objectos escondidos num saco. Depois proclamava bem alto, a “ternura” que estava disposto a trocar com o portador do par do seu objecto. (Como na altura se presumia que as “ternuras” só podiam ser trocadas entre menino e menina, as meninas escolhiam primeiro e os meninos depois; só dez anos mais tarde um amigo me revelou que isso não seria “totalmente correcto” ou até do agrado de todos... Mas enfim, éramos meninos e o jogo, mesmo assim, já na altura parecia complexo!)
Para meu infortúnio - sim, na altura considerei um infortúnio -, a garrafa não acabou de rodar na minha direcção mas sim na da menina que tinha um berlinde igual ao meu. O pânico instalou-se mas só em mim, pois ela, apesar de algumas fitas, parecia sentir-se bastante confortável com a ideia de me dar um beijo na boca.
Numa questão de segundos, mil imagens varreram a minha mente... Lamentei não ter lavado os dentes três vezes ao dia como o dentista recomendava, lamentei não me lembrar de roubar um pouco de after-shave  ao meu pai antes de sair de casa, lamentei  não ter ido jogar futebol – coisa em que me sentia perfeitamente seguro pois as minhas jogadas eram – essas sim – bastante perfumadas!
Lidei com o desconforto da situação com o maior profissionalismo. Era como se o treinador me tivesse colocado numa posição do campo a que não estava habituado e eu tivesse de mostrar, independentemente das circunstâncias, que sabia jogar futebol...
Ela pegou na bola, passou à ofensiva e eu deixei-a marcar golo.
Acho que gostei do beijo. Aliás, tenho a certeza que gostei, pois apesar de não lembrar com pormenor aquele momento, acredito que a sensação vivida é em tudo paralela às ocasiões em que abrimos uma caixa de bombons – o primeiro e o último são sempre os mais apreciados. Tanto é assim, que não me apetece mesmo nada escrever acerca dos bombons que recebi posteriormente (apesar de doces também!)
Em nome de muitos, vou antes escrever sobre a satisfação que sentimos quando a “teoria do bombom" se confirma e descobrimos a pessoa de quem queremos receber o último bombom de todos... Rezamos diariamente para que tal momento nunca chegue, procurando esquecer que todos os jogos de futebol têm um fim e todas as caixas de bombons acabam.
O verdadeiro amor é um suspiro de alívio, quando perante a imagem da nossa morte, sabemos perfeitamente quem nos irá dar o último beijo...
Para grande pena minha (e algum jubilo para quem detesta este blog), quando tal momento chegar, não vos poderei contar se o meu último beijo também teve sabor a banana, mas permito-me arriscar que talvez saiba a tutti-frutti.

Filipe Lascasas

P.S. Ofereçam bombons.



Ouvir com Sufjan Stevens - Casimir Pulaski Day

9 comentários:

  1. Adoro quando escreves sobre a melhor coisa do mundo! :)
    Bjs
    Mi*

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  2. Gostei de ler sobre o teu primeiro beijo...fez-me lembrar momentos meus e fiquei com um sorriso na cara. O sabor do meu primeiro beijo não me lembro, sei sim (como poderia esquecer!) que foi com um grande e primeiro amor que tive. Uma das paixões mais arrebatadas que tive e que 15 depois nos reencontramos para novamente ter que nos afastar...
    Umas vezes só se descobre o paraíso depois de lá se ter saido, outras há que se quer encontrar o paraíso no derradeiro momento que não se sabe quando será...
    Quanto ao jogo, onde dei os meus primeiros xoxos, na minha altura chamava-se o "verdade ou consequência". Com berlindes e coisas afins é algo muito à frente!!!

    Beijinhos

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  3. Adoro as tuas histórias!
    Tal como o primeiro beijo, queremos sempre repetir e repetir.... até a eternidade!

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  4. Obrigado. Quando leio os vossos comentários quero logo escrever-vos mais uma e mais uma....

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  5. Lembro-me, como se fosse hoje, do meu primeiro beijo.
    Lembro-me do local, dos cheiros...
    Só não me recordo da pessoa!!! :)

    Brincadeirinha!!!!

    Foi delicíoso!
    O meu primeiro amor...



    Declaro aberta a sessão...
    .. do xoxinho :)


    PS

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  6. Que querido! Devem saber todos a fruta, frescos e suculentos!

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  7. Porquê a tutti-frutti?
    Acho que este é sem dúvida um dos mais genuinos. Recorda-me os primeiros textos teus que li. A descrição está tão boa que consegui imaginar até a tua expressão naquela altura.

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  8. O meu primeiro foi roubado....os seguintes foram passando...os últimos ainda cá andam e dóiem...não sei se virão mais,mas os meus são sp c sabor a carinho e é assim q quero q seja o último....
    D qq forma todos os dias beijo mtas vezes todas as pessoas q amo como a minha filha,amigos e familiares,pq é enqto estamos vivos q temos q mostrar o q sentimos e a vida é mto mais colorida com mimo e amor....

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